Libânio
Neto, Fundador e Presidente do Instituto Raízes
Dando continuidade a entrevista com o nosso Fundador e Diretor
Presidente, Libânio Neto, os temas abordados agora serão o caráter pioneiro e
inovador do trabalho realizado pelo Instituto, os desafios e as conquistas.
Pioneirismo e Inovação
Porque caracterizar essa atuação do Instituto como algo pioneiro e inovador?
Libânio Neto: Temos
dito em várias oportunidades que o trabalho que fazemos é pioneiro pelo fato de
que fomos nós a iniciar uma experiência permanente, cotidiana e concreta,
coisas que antes não havia em Floresta e região. Somos referência em Cultura
Popular e sobretudo em Cultura Afrobrasileira. Não tem outro trabalho
semelhante em toda a região do sertão de itaparica.
Dizemos também que é inovador pelo fato de que estamos trazendo a vivência de tradições culturais que estavam abandonadas ou desconhecidas por muita gente.
Quantas crianças e adolescentes participam atualmente dos projetos em Floresta?
Libânio Neto: Temos
atendido de forma permanente (nas oficinas que realizamos) uma média de 50
crianças, adolescentes e jovens remanescentes quilombolas e indígenas que
residem no bairro do vulcão, santa rosa, cohab e caetano. Em novembro de 2016,
chegamos a reunir cerca de 80 crianças, adolescentes e jovens na celebração da
Consciência Negra.
Ritmos trabalhados
Quais os ritmos que são trabalhados nas oficinas?
Libânio Neto: Trabalhamos
(nas danças e também percussão) os ritmos que são de origem afro-brasileira e
indígena, e os ritmos que celebram a mistura entre o negro e o índio, os quais
são: capoeira, maculelê, afoxé, maracatu, coco de roda, samba de roda, mazurca,
caboclinho, ciranda, xaxado e danças africanas. De todos os que tem maior
ênfase são o Maracatu de Baque Virado, o Afoxé e o Coco de Roda.
Grupos Culturais mantidos pelo Instituto
Quais os grupos mantidos pelo Instituto Raízes?
Libânio Neto: Temos
dois grupos percussivos com um bom tempo de caminhada. O Maracatu Afrobatuque
que foi criado em 2011 e trabalha o ritmo do Maracatu de Baque Virado e o
Filhos de N’Zambi, criado em 2012, que trabalha o ritmo do Afoxé. Além destes,
estamos criando o Grupo Sou da Terra, que reúne os ritmos do Maracatu, Afoxé,
Coco, entre outros. Temos também o Grupo Dandara (grupo de danças
afroindígena), o qual foi o primeiro grupo criado pelo Instituto em Floresta,
no ano de 2010.
Metodologia
Qual a metodologia adotada no trabalho?
Qual a metodologia adotada no trabalho?
Libânio Neto: Adotamos
uma metodologia participativa, que estimula a capacidade e o potencial dos(as)
integrantes, vinculando o aprendizado às raízes históricas afrobrasileira e
indígena. Buscamos estabelecer, através do diálogo permanente, uma relação entre
o aprendizado cultural e a formação para a cidadania, consistindo sobretudo, em
regras de participação, obrigatoriedade de estar frequentando à escola (se está
em idade escolar), formas adequadas de comportamento pessoal e social e em
especial nas relações interpessoais entre a família e os demais participantes,
na perspectiva de estimular a superação de limites e o desenvolvimento da
personalidade.
Também trabalhamos a necessidade de se encarar as atividades com compromisso e responsabilidade, além do respeito necessário a simbologia e aos fundamentos de cada tradição cultural que vivenciamos.
Produzimos um espaço de convivência, de aceitação do(a) outro(a), eliminando qualquer forma de preconceito, despertando para a elevação da autoestima e para a busca de realizações positivas em suas vidas.
Dificuldades
Qual é a maior dificuldade enfrentada?
Libânio Neto: Quanto
as dificuldades, podemos separar em duas. A primeira são as dificuldades
internas no diálogo com os participantes, sobretudo pré adolescentes e
adolescentes. Esses(as) chegam com todos os vícios sociais ou comportamentais
vindos de relações interpessoais e familiares deterioradas, daí se produz um
choque com a nova realidade: disciplina, não aceitação de preconceitos,
obrigações, distribuição de tarefas e regras que são aplicadas, inclusive com
suspensões e afastamentos. Somado a isso ainda tem o que de ruim a cultura de
massa produz na cabeça das pessoas, tornando sempre mais difícil a compreensão
da mensagem principal que buscamos transmitir.
A segunda dificuldade, é a falta de apoio estrutural de vários setores que formam a sociedade, em especial os poderes públicos e certos seguimentos mais abastados financeiramente, que não dispõe qualquer ajuda nesse sentido. Recebemos muitos elogios quanto ao trabalho, más ninguém se dispõe a ajudar.
Preconceito
Este trabalho já sofreu algum tipo de preconceito?
Libânio Neto: Já
presenciamos várias reações preconceituosas, sobretudo em relação ao Afoxé e no
Maracatu, quando cantamos para os Orixás. Neste sentido, nossa reação foi
continuar tocando, cantando e dançando, porque o que fazemos é em nome de todos
os nossos antepassados que sofreram com a escravidão, a perseguição, os maus
tratos e toda uma imensa carga de preconceito e discriminação e, em honra ao
nome e a história que eles construíram, não podemos nos abalar. Quando estamos
nas ruas percebemos alguns olhares de reprovação. Já chegaram a me perguntar
por que trazer o maracatu pra Floresta e busco explicar o que abordei
anteriormente em relação ao significado histórico. Perguntam sobre o Afoxé, se
somos do Candomblé, entre outras perguntas mais.
Procuramos mostrar que trabalhamos com o resgate e a preservação das origens e tradições do povo negro e do índio, então o Afoxé como o Toré (para os indígenas) são expressões de tradições culturais que tem seu perfil religioso sim. No entanto, não dizemos a nenhuma criança, adolescente ou jovem, nem tampouco a seus pais e mães, que religião deve seguir. O que não podemos é negar que a religiosidade esteja presente na cultura. O que queremos é que eles e elas (meninos e meninas) tenham consciência que quando tocam o maracatu ou o afoxé estão mantendo uma ligação profunda com seus ancestrais e antepassados e à força (o Axé) e a paz que são produzidos nos toques/baques e nas cantigas/loas são de exaltação às nossas raízes humanas e à nossa cultura. Isso boa parte já entende e o que mais importa é que estamos tocando, cantando e dançando pra resgatar valores humanos e sociais, bem como reatar os laços culturais muitas vezes rompidos.
Hoje em dia, muita gente que olhava atravessado, tem opinião diferente e até mesmo elogia, porque estamos levando uma formação de vida para diversas crianças, adolescentes e jovens.
Resultados alcançados
Quais resultados positivos foram alcançados?
Libânio Neto: Em
pouco mais de 6 anos de trabalho, registramos vários resultados positivos.
Várias crianças e pré-adolescentes que entraram no projeto, mudaram de atitude
diante da vida, desenvolveram sua auto-estima e o orgulho em ser da comunidade
em que vive, de ser afrobrasileiro (a).
A comunidade do Vulcão mudou seu perfil, observamos hoje uma redução de vários índices anteriormente negativos, temos uma participação de uma maioria absoluta das crianças e pré-adolescentes, que nos motiva a seguir em frente.
Nosso trabalho é uma realidade concreta, não é "um projeto que pode
dar certo", é um conjunto de ações que deram certo e
mostraram que é possível transformar realidades, quando se une dedicação,
vontade de fazer, responsabilidade e amor à capacidade de superação existente
nas pessoas.
Não é só uma ocupação do tempo livre, é formação cidadã, é resgate da autoestima, é valorização humana. É uma oportunidade para construírem um presente e um futuro melhor. Por fim, o que podemos afirmar é que estamos promovendo a construção de perspectivas de vida diferentes, estamos promovendo verdadeiramente uma cultura de paz, através da música, da dança e de uma formação cidadã.
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