O pioneirismo resulta da ação
de uma rede de pesquisados do país que afirma ser possível 'plantar água',
'comer Caatinga' e 'irrigá-la com o sol'
Nos próximos dois meses, o
semiárido pernambucano pode ser pioneiro nacional na produção integrada de
alimentos vegetais, peixe e captação pluvial através da implantação de um
sistema agrovoltaico sustentável a partir da transformação da radiação solar em
energia distribuída. Os trabalhos técnicos para a instalação do sistema
fotovoltaico estão sendo realizados por uma startup local dentro da escola
Serta em Ibimirim. A iniciativa visa demonstrar provas materiais do conceito
científico de uma rede de pesquisadores nacionais (Ecolume), financiada pelo
CNPq e liderada pela climatologista e Doutora em Recursos Hídricos, Francis
Lacerda, coordenadora técnica do Laboratório de Mudanças Climáticas do
Instituto Agronômico de PE (IPA). O conceito Ecolume defende que é possível
"plantar água", "comer Caatinga" e "irrigá-la com o
sol" do local.
"No final do próximo mês
ou início de agosto, inauguraremos o primeiro sistema agrovoltaico sustentável
da América do Sul", celebra Francis, fazendo referência a revisão da literatura
científica que fez a respeito. Quando estiver totalmente implantado, terá a
capacidade de tornar todo complexo da escola Serta autossuficiente em energia
elétrica. "Nesta 1ª fase, serão instalados 30% do sistema fotovoltaico
planejado, auxiliando na redução imediata de um terno dos custos com energia
convencional", fala o doutor em Botânica, Diogo Araújo, proprietário da
VertSol, startup parceira do Ecolume com foco em eficiência energética que doou
placas fotovoltaicas que serão instaladas com a participação de alunos do local.
A energia gerada através do sol
será utilizada nos vários experimentos agroecológicos do Ecolume/Serta,
realizado pelo sistema agrovoltaíco - cujo integra a utilização de todos os
potenciais dos seus componentes. Os painéis fotovoltaicos instalados também
servirão de recipientes para a captação da chuva, além de gerar a energia solar
e bombear a água já armazenada para o cultivo de peixes e de plantas, inclusive
as nativas da Caatinga, com alto valor nutricional. Tal produção se dará
através do sistema de aquaponia, pois garante o uso, reuso e reciclagem da
água, possibilitando até adubação orgânica proveniente das fezes dos peixes.
Em seis meses, o sistema
agrovoltaico Ecolume/Serta terá a capacidade de produzir 60 quilos de carne
retirados das 100 tilápias por tanques de mil litros de água. E este recurso
hídrico será usado de forma integrado e simultâneo para o cultivo, em tubos, de
72 plantas de 12 espécies de colheita contínua e diferentes, em especial do
tipo medicinais, temperos e hortaliças. Dentre elas, hortelã – 40 dias
(contínua), rúcula – 40 dias, alface – 40 dias, taioba – 40 dias, bertalha – 40
dias, couve-folha – 40 dias, chapéu de couro – 40 dias, manjericão – 40 dias,
coentro – 40 dias, espinafre – 40 dias, cebolinha – 40 dias, menta – colheita
em 40 dias (contínua), tomates e cereja variados – 60 dias e alecrim – 60 dias.
O gerenciamento da água
capitada e bombeada também será utilizado para irrigação sustentável dos
viveiros de plantas originais da Caatinga para a alimentação humana, a exemplo
do umbu e outras, que podem entrar em extinção se não houver o devido
recaatingamento. O replantio dessas espécies do semiárido, já adaptadas
geneticamente às altas temperaturas, servirá como alimento humano, mas também
ajudará na manutenção da umidade do solo e regulação do clima local.
"Portanto, a partir do recaatingamento, é possível sim plantar água e
comer Caatinga como trata o Ecolume", defende o diretor do Serta,
Sebastião Alves.
O dirigente garante que ainda
serão produzidos outros frutos e Plantas Alimentícias não Convencionais
(Pancs), que têm alto valor nutricional e agregado, a partir da
operacionalização desse sistema agrovoltaico do Ecolume no Serta. As Pancs são
uma nova visão alimentar e gastronômica para as vegetações nativas pouco usadas
para tais fins. O criador desse conceito é o pesquisador internacional Valdely
Kinupp. Ele ministrará inclusive uma palestra no Recife sobre o tema, no dia 1º
de junho, a convite do Ecolume, às 9h no auditório do IPA, no Bairro de San
Martin.
"A aplicação e
operacionalização desses experimentos através do nosso sistema agrovoltaico
sustentável será um dos resultados principais do nosso conceito ecolumiano,
pois demonstrará a possibilidade de plantar água, comer Caatinga e irrigá-la
com o sol - metáforas estas que podem ser tornar muito reais através da fusão
do potencial solar local gerando energia, integrado à produção de alimentos
vegetais, peixes e captação pluvial num sistema cíclico", destaca a climatologista
do IPA Francis
Além dos benefícios
socioeconômicos e ambientais, o conceito e projeto do Ecolume prima pelo eixo
educacional e transmissão de conhecimento tecnológico para as comunidades
atendidas. Assim, a VertSol também capacitará os alunos do Serta sobre energia
solar, elementos, instalação do sistema fotovoltaico e etc. "Nosso
compromisso com o Ecolume é que cada um desses estudantes, a maioria deles
filhos de agricultores, seja capaz de replicarem tal sistema em suas
comunidades", diz Diogo.
Atualmente, a unidade do Serta
em Ibimirim tem 150 estudantes na área de Agroecologia, oriundos de cerca de
100 municípios de cinco estados do Nordeste. Uma palestra teórica sobre energia
solar e fotovoltaica será ministrada pela startup para todos alunos. Quinze
deles receberão treinamento teórico e prática sobre elementos e instalação do
sistema.
"Sem duvida, o experimento
do Ecolume dentro da nossa escola ajudará na formação teórico e prática de
nossos estudantes, funcionando como laboratório", diz Sebastião. Ele
espera que todos esses conhecimentos do sistema agrovoltaico por aquaponia para
criação de peixes, vegetais e para viveiros de plantas nativas da Caatinga
possam ser reaplicados em diversas áreas do semiárido, inicialmente pelos
próprios alunos, mas também pelas demais instituições parceiras que forma a
rede Ecolume.
Além da atuação do IPA e do
Serta, e da parceria da startup de energia VertSol, a rede Ecolume é formada
pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), Empresa Brasileira de
Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Instituto Nacional do Semiárido (Insa),
Instituto Federal do Sertão e a Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Sustentabilidade.
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